Advogado é preso e afirma que policiais violaram direitos do profissional

Advogado foi detido quando estava exercendo a profissão, algo que não é permitido pela OAB.

No dia 3 de abril, um encontro de amigos em uma chácara na cidade de Barão de Grajaú (MA) terminou de forma polêmica. A Polícia Militar foi até o local e, alegando desacato, acabou prendendo o advogado Dr. José Dias Neto, de 29 anos, de forma ilegal. Imagens da situação foram compartilhadas na internet.

O Rota 343 entrou em contato com o advogado para, através dele, saber o que ocorreu no local. Após a repercussão das informações, a OAB/MA (Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Maranhão) emitiu uma nota em apoio ao Dr. José Neto (confira no final da matéria).

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Segundo o advogado, os policiais agiram de forma arbitrária, violando a prerrogativa do mesmo, que no momento do ocorrido, se colocou na posição de profissional em atuação. De acordo com a Lei Nº 8.906, de 4 de Julho de 1994, nenhum advogado pode ser detido no exercício de sua profissão, exceto em flagrante delito por crime inafiançável. Veja abaixo o que diz o alguns pontos da lei que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB):

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CAPÍTULO II

Dos Direitos do Advogado

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Art. 6º Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos.

Parágrafo único. As autoridades, os servidores públicos e os serventuários da justiça devem dispensar ao advogado, no exercício da profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas a seu desempenho.

Art. 7º São direitos do advogado:

I - exercer, com liberdade, a profissão em todo o território nacional;

(...)

IV - ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB;

(...)

XXI - assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração: (Incluído pela Lei nº 13.245, de 2016)

(...)

§ 3º O advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício da profissão, em caso de crime inafiançável, observado o disposto no inciso IV deste artigo.

“O que aconteceu é abuso de autoridade, eles violaram minhas prerrogativas e tiraram minha liberdade de forma abusiva, sem qualquer amparo legal”, declara o advogado.

Foto: Arquivo PessoalAdvogado José Dias Neto.
Advogado José Dias Neto.

Entenda o caso

De acordo com o advogado, cerca de 15 pessoas estavam reunidas em uma chácara particular, localizada na zona rural da cidade, para comemorarem o aniversário de um amigo, que é policial militar e cliente de José Neto. No local, alguns “paredões” de som haviam sido montados para a reunião. Por volta das 21h, a Polícia Militar chegou na propriedade.

Juntamente com cliente, que faria aniversário na ocasião, o Dr. José Neto foi de encontro aos policiais para saber o motivo de terem ido até o local.  A guarnição informou que a PM de Barão de Grajaú recebeu denúncias através do WhatsApp, de que havia som alto, perturbando os demais moradores da vizinhança. Pelo fato da chácara ficar há mais de 3 km da zona urbana da cidade, às margens do rio, o advogado questionou se poderia ver as mensagens pois, aparentemente, não há nenhuma outra propriedade nos arredores do local, mas foi informado de que eles não tinham essas mensagens.

Atendendo ao pedido dos policiais, o advogado informou que o volume do som seria reduzido e, então, a guarnição foi embora do local. Em seguida, o proprietário da chácara foi até o portão da mesma e o trancou, usando corrente e cadeado.

O advogado conta que depois de alguns minutos, foi possível ver duas viaturas policiais chegando no local e, para evitar problemas, decidiram por desligar o som antes da chegada das mesmas. Segundo ele, alguns instantes depois, os policiais arrombaram o cadeado e invadiram a propriedade.

Ao chegarem na área onde as pessoas estavam reunidas, os policiais deram voz de prisão ao aniversariante. De imediato, o Dr. José Neto se apresentou como advogado do policial e passou a questionar os motivos da prisão. Neste momento, José Neto pediu para que os presentes filmassem o que estava acontecendo.

“Quando ele deu voz de prisão a ele, eu intervi e me apresentei como advogado dele, e indaguei sobre o motivo de ele estar sendo preso, além de ter informado que meu cliente não iria reagir e nem resistir a prisão. No vídeo é possível ver que a todo momento eu indago e questiono se irão violar minha prerrogativa", relatou José Neto.

Segundo o advogado, a resposta do tenente presente no local, que estava como Oficial de dia, apenas disse que era para ele ir com o cliente até a delegacia. O Dr. José Neto então questiona o não cumprimento da lei, pois foi recusado o direito do aniversariante ir até a unidade policial no carro do advogado, visto que os policiais insistiam em leva-lo na viatura.

Diante disso, o advogado continua a perguntar quais seriam os motivos da prisão, e a alegação policial é de que havia acontecido um desacato, além da violação do Decreto Estadual, que determina a proibição da aglomeração de pessoas em locais públicos, mencionando que o local seria um bar.

“Eu informei para ele que lá era uma propriedade privada e não um bar. Expliquei que era uma reunião privada, entre amigos e familiares, e que não havia nenhum registro de bar no local. Inclusive, o dono da chácara o convidou a olhar o local, assim como os freezers, para confirmar que não havia venda de bebidas no local, se tratando de um local particular.”

Em seguida, o policial informou que também estava acontecendo a perturbação do sossego público. Novamente, o advogado pede para ver as mensagens, e o pedido é negado. Além disso, Dr. José Neto informa que o som, suposto motivo da perturbação, não pertence ao cliente. Ele ainda disse aos policiais que, se quisesse realizar a apreensão dos carros e dos paredões, não haveria problema, desde que feitos os procedimentos legais da forma correta.

Como não havia provas de que o som pertencia ao policial de folga, o tenente voltou a dizer que o mesmo havia cometido um desacato, na primeira vez em que a PM se dirigiu até o local. “No vídeo é possível ver claramente que eu pergunto para os dois policiais que estiveram no local se, em algum momento, alguém havia sido discordial ou desrespeitado eles, e a resposta foi não”, afirma José Neto.

O advogado diz que precisou aumentar seu tom de voz para falar com o tenente, pois não estava sendo ouvido e, inclusive, se sentiu desrespeitado como profissional. Diante disso, o policial deu voz de prisão para o Dr. José Neto, entendendo o advogado que era ilegal por se tratar de advogado em exercício da profissão Questionado sobre o motivo de estar sendo preso, ele é informado que é por desobediência.

“Eu questionei os motivos de estar sendo preso, ele me informou que era por desobediência, configurando claramente um ato arbitrário e abusivo. Em minha defesa, eu dei voz de prisão para ele, que não foi cumprido pelos policiais. Apesar disso, eu não reagi em momento algum. Eu deixei claro pra ele que me apresentei como advogado e que, no exercício da minha profissão, eu não poderia ser preso. Ele me perguntou por quê, e eu informei que, assim como qualquer advogado, eu só poderia ser detido no exercício da profissão em flagrante delito por crime inafiançável, o que não era o caso. Eu então pedi para que uma testemunha me acompanhasse, mas não fui acompanhado”, garante o advogado.

Depois de algumas argumentações, o advogado foi encaminhado, no banco de trás da viatura policial, para a Delegacia de São João dos Patos, pois não havia delegacia de plantão em Barão de Grajaú. O advogado solicitou que um representante da OAB o acompanhasse, mas ele afirma que o pedido foi negado pelos policiais.

Na delegacia, o tenente informou aos policiais civis que o motivo da prisão era desobediência e perturbação do sossego. Porém, o advogado diz que a acusação é incoerente, visto que ele não é dono dos paredões, da chácara e também não foi o organizador da reunião.

Diante dos fatos, o Dr. José Neto entende que teve suas prerrogativas violadas e irá fazer uma representação, tanto na justiça comum quanto na Corregedoria, contra o Comandante do Pelotão de Polícia Militar de Barão de Grajaú, e também contra o tenente, responsável pelo plantão, assim como os policiais que deram cumprimento a ordem dele.

“Um fato como esse não pode passar despercebido. Vou combater esse tipo de situação, esse tipo de abuso. Eu jamais irei abaixar minha cabeça e recuar, assim como outros colegas de profissão. Eu irei lutar até as últimas consequências legais, para que todos sejam responsabilizados e respondam por seus atos”, comenta José Neto.

Decreto Estadual

No dia 3 de abril, o Governo do Estado do Maranhão prorrogou o Decreto Estadual que proíbe a aglomeração de pessoas devido à pandemia do novo coronavírus. A medida é válida até o próximo domingo, 12 de abril.

Apesar das alegações de que os envolvidos violaram o decreto, o texto do mesmo, no Artigo 1º, inciso I:

a) da realização de atividades que possibilitem a grande aglomeração de pessoas em equipamentos públicos ou de uso coletivo;

“O Decreto não determina a vedação em locais privados. Seria errado se o evento estivesse aberto ao público, feito convite para toda a população, ai sim estaria violando o decreto, pois seria realmente uma festa. Mas, não foi o caso, pois era uma reunião privada, que tinha entre 10 e 15 pessoas. Foi totalmente o oposto do que é proibido pelo decreto”, explica o advogado José Neto.

Nota

Em apoio ao advogado, a OAB/MA emitiu uma nota, repudiando a forma como os policiais militares do Maranhão agiram com o Dr. José Neto.

Confira abaixo a nota na íntegra:

A Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Maranhão, vem por meio desta, repudiar a atitude truculenta de uma Guarnição da Polícia Militar do Maranhão, que ao tentar dispersar um grupo de aproximadamente 15 pessoas que estavam em um momento de diversão em um ambiente privado e em uma área ao ar livre, no município de Barão de Grajaú, teria conduzido para a delegacia local, dentre os participantes, o advogado José Neto que tentou argumentar com os policiais sobre o motivo da abordagem e do pedido de condução de parte do grupo para a delegacia.

Em sua abordagem, os policiais alegaram o descumprimento de decreto estadual que proíbe aglomerações nesse momento de isolamento social que todos estão enfrentando. A reunião de um grupo de 15 pessoas, em um ambiente privado não poder ser considerado como aglomeração, tão pouco se justifica a condução das pessoas para uma Delegacia de Polícia, da forma que aconteceu.

Assim, a OAB Maranhão repudia a atitude dos policiais e se solidariza com o advogado, bem como se coloca à disposição do profissional para prestar total e irrestrito apoio nesse momento.

Igualmente, a Coordenação do Sistema de Defesa e Prerrogativa dos Advogados da OAB Maranhão, aproveita o ensejo para reiterar seu compromisso da defesa intransigente das prerrogativas da classe.

São Luís (MA), 09 de abril de 2020

Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Maranhão.

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