UMA VEZ
Racismo. Memórias. Infância. Floriano. Poesia.
UMA VEZ
Now I was eight and very small,
And he was no whit bigger,
And so I smiled, but he poked out
His tongue, and called me, “Nigger.”
Countee Cullen
Uma vez caminhando pelas ruas
Da minha cidade natal,
Com o coração cheio de sonhos,
Fui ao Mercado Velho de Floriano,
Ao quiosque de dona Isabel Carneiro,
Uma amiga antiga da minha rua, da minha casa.
Eu era uma criança, tinha doze anos,
E o coração quase a saltar pela boca,
Com a minha aprovação
No exame de admissão ao Ginásio,
No Colégio Industrial São Francisco de Assis.
Dona Isabel me abraçou e disse:
“Este menino vai ser um grande homem, um doutor”!
O homem de bigode vendia joias de ouro,
Num tabuleiro defronte, na esquina.
O homem branco sorriu com desdém,
Ele apontou para mim e disse:
“Doutor, hein...
Isso aí na minha terra é um rolo de fumo preto!”
Eu era uma criança, tinha doze anos
E não me esqueci desse acontecimento.
ELIO FERREIRA
América negra & outros poemas afro-brasileiros. São Paulo: Quilombhoje, 2014.
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